domingo, 16 de maio de 2010

Os homens de saias

Eu quase nunca não estou fazendo nada. Eu devia não fazer nada mais vezes.

Mas sempre que não estou fazendo nada eu fico pensando em ações mirabolantes que vão definir a minha vida. Como escrever um livro, fundar uma ONG, me mudar para uma cidade longínqua ou pelo menos arrumar os comprovantes de pagamento das minha contas, que se acumulam em maços de papéis alojados nos lugares mais insuspeitos, como uma bolsa que eu não uso há meses ou a gaveta de lençóis do guarda roupa.

Quando eu penso em escrever um livro, quase sempre desisto porque nunca encontro a frase inicial perfeita. Imagina, então, encontrar o fim. Antes de largar a ideia, no entanto, fico pensando em quem eu seria de saias. Porque todo mundo parece ter essa fixação em definir uma mulher como um determinado fulano "de saias". Pode ser qualquer um, não importa: basta acrescentar o "de saias". "Nabokov de saias", "Paulo Coelho de saias", "Joyce de saias" - este último, para o português de costume, parece apenas uma expressão natural descrevendo a manicure, a vizinha ou a recepcionista do consultório envergando uma bela e florida peça usual do vestuário feminino, e não uma comparação perversa de gêneros (tanto sexuais como literários).

Caso o objeto de comparação já seja uma mulher, pode-se passar para o "tupiniquim", com a variação pseudolibertária "dos trópicos". Assim: Miranda July tupiniquim. Marian Keyes tupiniquim. Jane Austen dos trópicos.

Depois disso, só falta ganhar o Jabuti, que é o "Oscar da literatura". E se ver envolvida em um escândalo de superfaturamento de edições noticiado como o "editoragate".