domingo, 26 de setembro de 2010

Deus quando fecha uma porta

Carambolas e dálmatas são obviamente cuidadosos projetos de design.

Quando Deus trabalha sem freelas, ele faz cachorros normais -- como os labradores -- e flores óbvias -- como as margaridas.

Eu, que sou temente a Deus, adoro labradores e margaridas.

Mas sinto um soluço de espanto quando vejo dálmatas. (Quando vejo freiras também, mas isso não vem tanto ao caso).

Já quando Deus trabalha com estagiários, temos coisas como o pepino e o bilby.


.
.
.
Dedicado à Raquel e aos nossos frutíferos after hours

Info/Photos/Cities Visited

Tenho sonhado com coisas malucas.

Tudo bem. Estranho é sonhar com coisas normais.

Noite passada, pessoas mortas sacudiam elevadores antigos e a Ana Maria Braga pilotava um avião. Ela foi me buscar na praia (de avião) para eu fazer um exame do refluxo. Eu sabia que tinha de levar os famigerados exames anteriores, mas só encontrava uma das endoscopias -- e eu já fiz duas. Não tinha ideia de onde procurar a outra. E a Ana ficava lá, me esperando, com o avião na areia.

Noites antes, tivemos uma salva de palmas para minha vó, e uma pergunta tão cortante que não ouso descrever.

É como se eu estivesse a um fio.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Macarrão com cebolinha

Quando eu tinha uns 20 e poucos, trabalhava em uma pequena agência que fazia uma revista de decoração meio tosca.

A "redação" se resumia a mim, outro jornalista e uma estagiária, a Giu.

Nessa época, meu irmão tinha uns 15 ou 16. E me ligava pelo menos uma vez por semana, perto da hora do almoço, para saber como fazer macarrão com cebolinha.

A receita de macarrão com cebolinha é muito simples. Consiste, basicamente, em macarrão cozido com molho de manteiga e cebolinha frita (na própria manteiga).

Mas o João Paulo nunca se lembrava do que tinha que colocar primeiro na panela: o macarrão? A manteiga? A cebola?

A receita é bem simples e o macarrão com cebolinha pode ser obtido assim: cozinhe o macarrão; reserve*; frite cebola bem picadinha em uma ou duas colheres de manteiga; jogue o macarrão dentro; salpique com queijo ralado a gosto e está pronto.

Acho que a parte do "reserve" é a chave do preparo, e é justamente a que fugia ao João Paulo toda vez. Então ele achava que aquilo tudo ia sair de uma mesma panela: macarrão, água, manteiga, cebolinha. Até o queijo ralado, quiçá.

Até a Giu aprendeu a fazer o macarrão com cebolinha.

Já o João Paulo, não sei. Acho que ele aprendeu. Ou nunca mais teve vontade de comer.


* Pode-se, inclusive, reservar o macarrão na própria tampa da panela, se você quiser economizar louça. Mas isso pode causar acidentes como: queimaduras nas mãos do cozinheiro ao pegar a maldita tampa pela borda para misturar a massa ao molho; perda parcial ou total da massa para o ralo da pia devido à instabilidade da tampa, quando colocada de ponta cabeça; ou, ainda, ambas as anteriores.

Um amor absoluto pelo homem que eu vi

Como eu vivi até hoje sem essa música?

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Tempos difíceis

"She totally confused all the passing
piranhas"

-- Presidents of the USA, Lump
Quando eu estava no terceiro ano colegial não havia internet. Pelo menos, eu não conhecia ninguém que tivesse.

Eram tempos difíceis para quem queria cantar direito suas músicas favoritas em inglês: poucos CDs tinham encartes, a Bizz Letras Traduzidas saía em uma periodicidade muito particular, quiçá insondável, e os folhetos da Fisk praticamente só tinham músicas do Roxette e do Bryan Adams.

Então, se você gostava de Presidents of the United States ou daquela música cantada por uma mina na trilha sonora do Pulp Fiction, tinha que se esforçar. E tirar de ouvido.

Aí, quando eu estava no terceiro ano colegial, um menino da minha classe foi estudar um semestre nos EUA.

Eu até gostei mais dele, que eu achava bobo antes, depois disso.

(Talvez porque eu gostasse de me apaixonar um pouco pelas coisas que estavam indo embora).

E na volta o menino ganhou alguma reputação, porque cantava "Lump" de cor e salteado, sem errar, nem embromar.



Esse era o tipo de coisa que te dava alguma reputação em 1995.

Vá chamar o Vincebo

Começava assim:

"- Vá chamar o Vincebo."

A partir dessa frase corriqueira, toda a família se alvoroçava. Eles não eram ricos, longe disso, mas também não eram miseráveis. Moravam no campo, sem dúvida. Aquelas casas iluminadas à luz de lampião e caiadas de branco com janelas verde-água. Ou caiadas de verde-água com janelas azuis. Enfim.

A velhinha estava deitada na cama e só mandava chamar o Vincebo uma vez, decidida. Seu pedido seria atendido, mas custaria um bocado de elucubrações individuais para cada membro daquela família.

O problema é que *eu não consigo me lembrar porque ela estava mandando chamar o Vincebo*.

Eu pensei nessa história quando estava quase dormindo. Ela parecia muito boa. Muito boa mesmo. E, sobretudo, ela fazia total sentido.

Só que agora eu não me lembro do fim. Quer dizer, do motivo. O motivo era tudo. O motivo da velhinha para chamar o Vincebo.

Ou talvez eu só estivesse com febre, para inventar um nome assim.

(Pronuncia-se vincêbo, sim?, com a tônica no ê).

domingo, 12 de setembro de 2010

Um branco, um xis, um zero

2010. A Lara entrou no meu quarto e falou:

- Seu quarto tem o seu cheiro! Sempre tem esse cheirinho, desde que você morava na sua outra casa em São Bernardo. Em todas as suas casas, seu quarto tem esse cheiro.

1995. Eu tinha 17 anos e era apaixonada por um menino da escola. Um dia ele esqueceu a blusa na classe. Eu guardei e levei para casa. E tinha esse cheiro. Quando devolvi a blusa, perguntei que perfume era aquele.

- Minotaure.

Esse é o único perfume que eu uso. E isso só acontece quando eu tenho dinheiro para comprá-lo. No momento, tenho meio vidro em cima da penteadeira e passo todas as manhãs (em que não me esqueço).

Eu quase já me esqueci da cara do menino. Mas nunca do perfume.

Não é mais o menino. É só o perfume.

Léxico familiar


quinta-feira, 9 de setembro de 2010

As circunstâncias musicais dos momentos mais bonitos

But it takes so long, my lord
-- George Harrison, "My Sweet Lord"
Aí que quando vi pela primeira vez as fotos da Beatriz -- que, veja só, eu só conheço em fotos -- me apaixonei de imediato por ela. E estava tocando "Shine Yellow", da Mallu. E essa virou a música da Beatriz.



E pouco antes do Pedro nascer -- depois de uma gestação que para nós, os mais de 35 mil espectadores pagantes (e ansiosos), pareceu levar cinco anos -- eu fui à casa dos pais dele e joguei Beatles Rock Band. E a gente, que enchia a sala, cantou "Dear Prudence". Tudo horrível, desafinado e cheio de amor. E essa virou a música do Pedro.



E quando eu soube que ia ser madrinha do Caetano, meus olhos se encheram de água e meu coração também. E o Winamp começou a tocar "My Sweet Lord". Que, no fundo, é uma oração. E essa continua sendo a música do Caetano.



Eu dou sorte com as circunstâncias musicais dos momentos mais bonitos.